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Mensagens

Quando o silêncio castiga

Eu tinha 10 anos , acabava de entrar num colégio escolhido à minha revelia e iniciava o temido quinto ano sem nenhum dos amigos da primária por perto.  Estranhei tudo .  A natureza gigante que envolvia o meu estabelecimento de ensino anterior era agora substituído por betão, azulejos em altura e um recreio de cimento onde não era aconselhado correr pela probabilidade de esfolar os joelhos mesmo antes de alcançar uns míseros 100 metros.  O ambiente era da cor do betão, os professores eram muitos, eram altos e rígidos como o cimento. Os colegas de turma não tinham brincado na mata como eu, não tinham jogado à bola e à macaca em campos de futebol de perder a vista, não tiveram um lago cheio de patinhos que faziam qua qua debaixo das copas das árvores gigantes que ofereciam sombra a centenas de meninos e meninas na primavera e no verão. Estes novos colegas, por sua vez, viviam habituados a muitas salas distribuídas por muitos andares e apenas a duas saídas: o portão da frente...

Filhos

Os filhos não são nossos. São do mundo . É preciso coragem , para quem vai e para quem fica.  Coragem para viver a vida que se procura, resiliência para superar as curvas quando o caminho deixa de ser uma reta e esperança neste mundo gigante que promete fazê-los mais felizes do que a nossa rua algum dia foi capaz. Coragem para ver partir, resiliência para suportar a saudade e esperança que esse mundo gigante seja quase tão bondoso quanto o nosso colo. "Filho é um ser que nos emprestaram para um curso intensivo de como amar alguém além de nós mesmos, de como mudar nossos piores defeitos para darmos os melhores exemplos e de aprendermos a ter coragem”  Saramago tinha razão, sempre chegará a hora de devolver o que nos foi emprestado. Obrigada meu amor por me ensinares a ser corajosa.

O Telefonista é vosso. Lançamento - Porto, 14 de junho de 2025

O dia que apresentei o meu primeiro livro ao mundo. E que dia magnifico! Ao chegar à livraria Fnac nem queria acreditar. Amigas de infância, amigas da idade adulta, família, desconhecidos, vieram de perto, outros de longe, só para me ouvir. Eu que adoro palavras, temo não conseguir explicar a alegria imensa que senti. O amor que recebi neste dia ficará para sempre em mim.  Falei genuinamente sobre o livro, sobre a razão da sua existência e todo o processo da escrita.  Expus sentimentos sem pudor ou receio, porque à minha frente via uma plateia emocionada e em silêncio a receber toda a minha verdade. Depois, mergulhei num mar de autógrafos e abraços. Ouvi tantas palavras de amor e dei conta que, sem saber, marquei a vida de tantos que passaram pela minha. Às vezes, o amor está onde menos se espera. Mil vezes obrigada💙                              

O telefonista

O meu sonho tornado realidade: O Telefonista. O meu livro, que a partir de hoje deixa de ser só meu, será também de quem o quiser.  Uma história verídica. A minha. Precisei de a escrever para o meu coração sossegar.  Agora que está disponível para a partilhar com o mundo, o meu coração rebenta de alegria, entusiasmo e muita adrenalina. Espero que gostem.🩷

A idade dá, mas também tira

A idade oferece  experiência, sagacidade e muita serenidade que contrasta com a pressa e a inquietude de outrora. Mas também nos tira , de mansinho e com pinças cirúrgicas que levantam pensos que só percebemos ter quando eles se descolam da pele, devagar.  A juventude soma amigos, momentos velozes de alegria, projectos e conquistas. Anos imunes a perdas. É uma conta de somar sem fim à vista, que um dia vira subtração , lá mais para a frente.  Percebemos o dia em que lá chegamos quando abrimos o calendário e nos deparamos com o lembrete do aniversário daquela amiga que partiu há poucos dias.  Numa fração de segundo, estamos a clicar o botão direito do rato e ordenamos apagar .  Repetimos a ordem à lista de contactos. “Tem a certeza que deseja apagar este contacto?” - Claro que não! Mas do que me serviria um número de telemóvel que já não toca, que por agora esbarra no voice mail até ao dia em que se torna numero não atribuído? Apagar. Está feito.  De...

Fui tudo o que consegui ser.

  Sou pedra de tanto que me construí, sou água de tanto que me deixei levar, sou estaca de tanto que me reergui e sou mel de tanto que amei. Sou tudo o que consegui ser. Uns dias fui tudo , noutros nem existi . Tanta fortuna amealhei, esta abundância desmedida de vida, de perda e vazio, de coragem cheia de esperança. Por todos os ásperos capítulos, eu já me perdoei .  A paz interior instala-se devagarinho naquele que faz as pazes consigo mesmo, naquele que aceita tudo como seu, mesmo o mau, porque mesmo o mau traz sempre algum bem. Basta procurar .

Dez anos depois.

Papá, estamos a viver uma pandemia.  Estou dentro de casa há vinte dias. Já senti tudo, papá! Medo, tristeza, pânico, saudade. Já precisei de contar de forma decrescente dos vinte aos zero, algumas vezes. Na verdade, mais vezes do que aquelas que julguei precisar. Ao fim de uma longa e forçada semana em casa, saí à rua pela primeira vez, por poucos minutos, para ir à padaria. A rua estava praticamente vazia, ouvia-se cada nota de um silêncio perturbador e difícil de explicar, o ar parecia suspenso, ameaçador. As poucas pessoas que vi, de rosto escondido numa máscara, não se olhavam de frente, os seus olhos fugiam dos olhos dos seus semelhantes. Estranhamente parecia que ninguém se queria encarar. Já é difícil não partilhar alegria, para quê fazer questão de partilhar tristeza? A padaria parece um cenário de guerra, com barreiras que nos impedem de chegar ao balcão ou às mesas, com paredes de acrílico mal-amanhadas a separar quem quer pão de quem o quer vend...