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Mensagens

Quando o meu dia é uma tourada.

Hoje percebi o que é verdadeiramente um espetáculo de tauromaquia.  Exacto. Foi o meu dia. Até acordar tudo permanecia igual, intacto e pacífico. Meia ensonada olhei o céu, alimentei-me normalmente como um toiro a quem é servido um pequeno almoço dito normal, para um dia normal.  Pobre toiro que nunca sabe para o que vai.   Depois de alimentada fui encaminhada até às imediações da arena. Tudo normal. O céu continuava azul. Em silêncio fui caminhando, devagar como um toiro, ganhando balanço para o dia. Abriu-se a porta. Sim, a dos curros para a arena. Dei uns passos distraídamente. O silêncio unsurdecedor da arena que antecedeu a tourada instalou-se de forma tão mordaz, tão acutilante que apenas mereceu o meu maior fingimento de auto-proteção de que tudo estaria bem. Percebi pelo capote do novilheiro que provavelmente o dia na arena prometia. Cavalos lusitanos, cavaleiros a rigor do alto da sua presunção, arrogância vestida a preceito, posturas de desdém de quem...

Uma família muito moderna.

Enteados. A bem da verdade a língua portuguesa não foi simpática com este laço familiar. Nome sem muita doçura associada tal como tem a palavra "filho", com tamanha carga de afecto e responsabilidade.  É injusto. Os enteados não devem ser menos importantes que os filhos. Devem e serão sempre especiais também, porque a bem dizer são filhos de alguém nosso, apenas não são os nossos.  Mas será feita justiça ao dizermos que não são nossos? Madrastas e padrastos que os receberam na sua vida não são uma peça de lego que se coloca e retira de quinze em quinze dias.  Sejamos honestos, recebê-los como parte da pessoa que amamos (tardiamente achamos nós, porque se tivesse sido mais cedo eles seriam nossos filhos e pudessemos nós mudar isso éramos ainda mais felizes...admitam e deixem-se de tretas!), criar rotinas familiares, estar lá quando choram, quando riem, quando morrem de sono ou morrem de fome, esperar a sua chegada com planos para os dias seguintes, sent...

Eu e tu em Marrocos.

Eu vi o fim do mundo. Ao chegar, Abdhul esperava-nos, sorridente e humilde.  "Salam! parles vous francais? how are You?" Nesta tentativa cosmopolita de nos ouvir, agarrou as malas e voltou à fala inglesa com sotaque de Alá dizendo em modo feliz "Follow me!" Perdi a conta aos passos, perdi a conta as vezes em que que viramos à esquerda, as vezes em que viramos à direita, às crianças descalças, aos burros que puxavam carroças, às motas em ziguezague, às bicicletas carregadas de especiarias e as vezes que Abdhul sorria para nós sem largar o passo acelerado como se quisesse encurtar o fim do mundo até ao Riad.  Era a última porta de uma rua escura, estreita e fresca. Obrigou-nos a olhar e a ler a placa dourada pregada naquela porta de madeira incrivelmente trabalhada "Riad Ambre et Epices, voilà!" Abriu a porta num som de quem abria um cofre e voilà: o fim do mundo acabou! O silêncio e a paz eram a banda sonora de um paraíso de luxo, outrora casa d...

Sabes a sorte que tens?

Sexta-feira, final do dia ainda com sol. O bastante para aquecer o coração. Cansada, com a missão cumprida, embora ligeiramente desapontada com os últimos dias, triste com a natureza humana que as vezes teima em não evoluir, desejosa de voltar a casa e sedenta do meu porto de abrigo. Cheguei  estação, faltavam apenas 9 minutos para entrar no comboio. Foram só 9 minutos, os suficientes para me deixar de coração apertado durante as 3 horas de viagem. Um labrador branco deitado no chão, cativou o meu olhar pelo seu ar doce e sereno.  Em segundos percebi que este anjo da ternura era um guia de uma menina aparentemente tão doce quanto ele.  Ela não  teria mais do que vinte anos, cabelos longos cor de mel, vestia jeans e t-shirt, nas costas uma mochila com um peso visivelmente considerável, na mão direita a trela daquele que parecia ser o seu único amigo, e no rosto, lágrimas. Lágrimas difíceis de controlar que lhe faziam tremer o tronco. Percebi nesse momento a verdadeira...

O meu amor

O meu amor vive de ternura e reboliço.  Vive de absolutos e de abraços que trespassam. O meu amor vive com a alma e só repousa no colo do meu sangue quente.  O meu amor promete-me a vida e a vida depois da morte. O meu amor sobressalta-me, acorda-me, adormece-me. O meu amor chega-me, transborda-me. O meu amor dá-me sonhos, o meu amor faz-me o caminho. O meu amor não tem prazo, não tem fim. O meu amor és tu.

A segunda mulher

A segunda mulher chega, ainda não abriu a boca, e já apresenta inúmeras contra-indicações. -"Porque se calhar é mais uma, porque as crianças ainda estão muitos traumatizadas e isto não vai ser nada bom, porque ela nem sabe onde se vai meter, porque é vegetariana e cá em casa quem não é para comer não é para trabalhar..." Depois de ultrapassada a fase do-deixa-ver-no-que-dá já todos parecem mentalizados! - " Olha afinal veio para ficar, até tem sido amorosa, eles estão tão felizes, quem diria!" Os enteados gostam dela mas se os pais estivessem juntos era muito melhor , os cunhados e cunhadas, sogros e afins já acrescentam mais um prato na mesa sem questionar, mas ela não é a mãe das crianças, por isso acho bem que não opine , os sobrinhos nunca lhe chamarão tia, porque ela nem os viu nascer, calha bem! Na altura das festas é uma chatice, não podemos convidar a primeira e a segunda, ora que maçada! O tempo passa, aliás o tempo voa, e a segunda mulher cui...

O princípio do nosso tudo

Porque já te amava antes de te conhecer em cada onda esperei que chegasses Voei ao tempo que ainda não era nosso Criei em mim o amor e a saudade do que viria Renasci na esperança quando te materializaste O relógio parou e eu continuei a contar cada segundo e por cada minuto que esgotava,  acreditei que todas as horas  somavam os dias de uma incrédula espera Só o tic-tac do nosso caminho deu corda à vida e hoje juntos vemos a chegada de cada onda, mas nada esperamos porque nos basta ter a mesma areia debaixo dos pés.